Os artesãos das palavras
Os
contadores de histórias são personagens conhecidos hoje. São diversos os
eventos que chamam esses personagens para se apresentam principalmente para
contar histórias para crianças nas mais variadas situações, desde festas de aniversários
e encontros em praças públicas a eventos promovidos por livrarias.
O
que muita gente não sabe é que o contador de história tem sua origem muito
tempo atrás e em lugares muito distantes de nós.
Recentemente
um grupo de alunos do curso de jornalismo decidiu realizar um vídeo
documentário sobre uma entidade denominada Griots que, a exemplo de grupos que
percorrem a ala infantil de hospitais para levantar a moral de crianças
internadas, ao invés de se fantasiarem como os já conhecidos Hospitalhaços, os
Griots do documentário contam histórias para as crianças. Não por acaso,
escolheram o nome de Griot para o grupo. Perguntados durante a apresentação se
sabiam a origem do nome griot (na grafia francesa do termo), os alunos disseram
que não. Pois bem, esse grupo de contadores de história se denominou Griot
porque muito provavelmente conhecem a bonita e importante história dos griots
africanos. Assim, pessoal, é importante, sim, saber a origem do nome do grupo
sobre o qual farão o documentário. Mesmo porque, se “querem vender o seu
peixe”, quanto mais informação sobre ele fornecerem, mais poderão pedir por
ele, certo? E conhecimento não ocupa espaço.
Então
vamos lá:
De
acordo com Ahmadou Kourouma, do livro Homens
da África[1],
o
“griô é uma
instituição da antiga civilização mandinga ou do Mali e pertence a uma casta
socialmente inferior aos nobres e mostra respeito por eles em todas as
ocasiões. Ele vive da generosidade dos nobres e só pode se casar com uma mulher
da própria casta. (...) No Antigo Reino Mandinga, cada príncipe tinha um griô e
era seu protetor. O griô acompanhava o príncipe em suas caminhadas e cuidava do
protocolo. Hoje em dia esses artesãos das palavras não são designados a
ninguém. São livres, públicos e ambulantes.
Quais são as
funções do griô?
Nas reuniões
públicas, o griô apresenta seu protetor e declama sua genealogia. Ele lhe
propõe louvores. Quem não tem um griô particular e participa de uma dessas
reuniões é louvado por um griô público. O homem da palavra serve de porta-voz
nas assembleias e de conciliador nas controvérsias. Intervém como mediador
entre indivíduos e famílias. Sabe tratar de todo tipo de procedimento,
especialmente dos pedidos de casamento. E serve de arauto, anunciando as
novidades de interesse geral para a população.
O griô é poeta
e músico. Toca xilofione e kora. (...)
O griô conhece
e ensina a história dos mandingas, com destaque para Sundjata, o imperador que
unificou as terras desse povo. O griô guarda também a memória das genealogias
dos clãs, a qual declama e glorifica durante as reuniões públicas” (pp. 10-16).
Na
chamada “África profunda”, nas sociedades negro-africanas que não adotam a
escrita e têm na oralidade a sua principal fonte de transmissão do saber, a
figura dos anciãos como guardadores da memória coletiva é imprescindível para a
manutenção da história dos povos dos quais fazem parte. São pessoas idosas que
pela idade têm o respeito dos outros como aqueles que têm a experiência e a
sabedoria da vivência de muitos fatos. São chamados para resolverem problemas,
questões de famílias e da aldeia, fazem discursos e resolvem situações que
necessitam de algum tipo de intervenção, julgamento e punição aos considerados
culpados. Normalmente reúnem-se sob a árvore da sabedoria (árvore da palavra,
árvore da vida) junto às pessoas da aldeia durante eventos importantes. São os
guardiões da palavra e da memória através da palavra. E a palavra, para esses
povos, é algo sagrado e que não deve ser proferida em vão. Assim, pensar antes
de falar e, sobretudo, refletir sobre as palavras, é algo extremamente
importante para eles. A “metralhadora verborrágica”, tão comum na nossa
sociedade, que dá atenção àqueles que falam muito e falam rápido, sem, no
entanto falarem não importa o quê com a intenção que não outra senão a de chamarem
a atenção para si mesmos, não tem vez nessa sociedade, que preza a sabedoria
das palavras proferidas com intenções específicas. Algumas sociedades, como a
ruandesa, os sábios anciãos contavam a história de seu povo remontando há
séculos atrás, sabendo dizer toda a genealogia dos príncipes e reis que
antecederam os atuais de seu povo.
Ao
conhecer um pouco mais sobre a história desse personagem tão importante, agora
vocês entendem o porquê da escolha do grupo pesquisado sobre esse nome, e, portanto,
sobre a intenção dele em se autodenominar Griot. Nada é por acaso, não é?
Então, futuros jornalistas, nada de ficar na superfície, certo? Curiosidade faz
parte da profissão de vocês!
Bom trabalho!
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